terça-feira, 25 de junho de 2013

Os Atos Falhos De Todos Nós



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Atos falhos são manifestações inconscientes. Ocorrem sob forma de incidentes aparentemente sem sentido, como lapsos, esquecimentos, erros de expressão, trocas de nomes, ou quando, sem querer, falamos algo sem a intenção de querer dizer aquele 'conteúdo'. 
Os atos falhos definitivamente quase nunca (para não ser determinista) são insignificantes. Sempre têm uma representação sob forma de memórias ou emoções recalcadas no passado. O ato falho não é objeto específico de tratamento em um processo psicoterápico, pois ele não é considerado um problema. Ele se manifesta representando o que está escondido, negado, recalcado e como manifestação inconsciente tem a sua importância. Nunca pode ser desprezado, no sentido de se achar que ele não significa nada.
A terapia é um processo. Necessita de tempo. Não mais daquele tempo dispensado na época de Freud. Hoje as pessoas tem facilidade em falar. Têm necessidade de se expressar; 'abrir o verbo', 'abrir a alma'. Por isso os procedimentos são mais breves e as 'problemáticas' quando desvendadas, resolvidas, são substituídas por outras também existentes, porém mais latentes, menos superficiais.
O psicoterapeuta ou analista, em sua prática cotidiana, fica ligado às expressões manifestadas pelo paciente para tentar conduzi-lo à interpretação de seu momento, de sua situação, de sua vida. A realização de um insight é sempre um momento único, leva o processo 'pra frente'. Elucidados em situação terapêutica, onde em um ambiente seguro e propício os insights se dão, a interpretação do que está 'por trás' de um ato falho é libertadora. Conduz a pessoa à novas descobertas, avançando em seu auto conhecimento. 
Atos falhos não são privilégio de poucos. Todos nós em algum momento os expressamos. De uma forma mais corriqueira, em algum momento, até por situações sociais, omitimos alguma opinião, seja para não chocar ou não machucar alguém e, quando vemos, somos 'traídos' pela manifestação inconsciente através de um ato falho. 
Outra condição inequívoca para a presença do ato falho é devido a todos nós termos um passado. Ele (o passado) nos acompanha, e a existência dele, por si só, já justifica a presença de atos falhos em nossa vida. É se valer da interpretação para, descobrindo o que estes significam, conhecer melhor à nós mesmos.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Desejo Versus Necessidade





Temos a pretensão de ter tudo. Somos eternos insatisfeitos. Passamos a vida sem entender que isso acontece porque convivemos com o lugar da falta. Aquele vazio que jamais será preenchido. Ou,  se momentaneamente preenchido, logo será substituído por outro vazio.
Apesar de desde crianças convivermos com a diferença entre desejo e necessidade, chegamos a idade adulta ainda fazendo muita confusão na hora de separar um do outro.
Para a Psicanálise o desejo é psíquico. Nos impulsiona na vida a realizar nossos sonhos, nos tira da imobilidade. O desejo nos direciona às fantasias. A necessidade nos direciona à realidade. O desejo nunca é completamente realizado, no sentido que aquele é imediatamente substituído no hiatus de tempo entre sua realização e a imediata instalação de outro. A necessidade é saciada. O desejo jamais. Quando temos sede, temos a necessidade de beber água. Esta (a sede) é assim saciada. Desejamos um amor, uma viagem, um carro novo. Quando os temos, logo começamos a nos 'desencantar' querendo sofisticações, mudanças, cheiro de carro novo de novo e vontade de ir à Roma mais uma vez. 
Parece complicado  mas quando nos atemos a observar, conseguimos identificar as particulares de cada um. E a identificação destes nos habilita a melhor entender nosso funcionamento. Nos ajuda  também a 'sossegar' quando algo não sai do jeito que queríamos. Conseguimos assim dar um significado novo ou um re-significado para nosso momento.
Vai parecer trocadilho, mas a necessidade de desejar alimenta nossa vida, psiquicamente falando. Sem desejar, estaríamos mortos. Plagiando Nietzsche, 'o que nos falta nos fortalece'. Para interpretar.

sábado, 22 de junho de 2013

Os Donos Do Saber


                         
                            MAS NÃO AO




Em seu artigo 4º, o projeto de  lei que institui o Ato Médico, prevê que constituem atividades privativas dos médicos a formulação de diagnósticos nosológicos e respectivas intervenções terapêuticas. 
Alguns profissionais da Medicina, por força de suas especialidades, realmente estariam habilitados a prestar pareceres e diagnósticos em algumas áreas. Por exemplo, um Psiquiatra em tese estaria habilitado a reconhecer uma condição emocional passível de acompanhamento psicoterápico, um endocrinologista provavelmente estaria apto a diagnosticar um transtorno alimentar e indicar tratamento, mas nunca prescindindo dos profissionais reconhecidamente formados para, desde o diagnóstico, acompanhar esses pacientes, no caso psicólogo e nutricionista. 
O projeto do Ato Médico caminha na contramão da história. Em 1988, muito se avançou no país na área de saúde, pelos princípios de universalidade e integralidade do SUS- Sistema Único de Saúde. A filosofia do SUS é perfeita, onde uma equipe multidisciplinar trata e cuida de um ser humano que é único como pessoa e ao mesmo tempo plural em suas necessidades de saúde integral. A troca de saberes específicos de cada área, acabaria por enriquecer o conhecimento de todos os profissionais envolvidos no processo, porém, respeitando sempre os limites mais absolutos de cada área. Assim ganhariam os pacientes, assim  ganhariam os profissionais. 
O Ato Médico anula por completo a noção da Psicossomática, visto que em alguns trechos, demonstra tornar a doença como algo estritamente orgânico, em uma visão reducionista do ser humano, entendimento ultrapassado desde 1939 quando esta - a Psicossomática - vem sendo cultivada no meio científico através de esclarecedores estudos sobre a multiplicidade de fatores envolvidos no processo de adoecimento. 
Indiscutivelmente, a maior aberração do Ato Médico é realmente dispor que o diagnóstico nosológico e a indicação de um posterior tratamento sejam competências exclusivas de médicos. Esse é sobretudo um desrespeito à preparação de profissionais de áreas afins da saúde, que tiveram, tal como os médicos, sua formação criteriosa e específica em suas áreas particulares. O médico não pode ser considerado o dono do saber. Será que ainda não entendemos que não existe absolutismo quando nos referimos à 'ser humano'. Eu, se médica fosse, teria vergonha desse despropósito. 
Para 'adoçar' o conteúdo do texto, na continuação do artigo 1º parágrafo 2º, dispõe que: "não são privativos dos médicos os diagnósticos psicológicos, nutricional e sócio ambiental e as avaliações comportamental, e das capacidades mental, sensorial, percepto cognitiva e psicomotora".
Essa lei pode influenciar inclusive aos pacientes que podem passar a uma condição de encolhimento, de um 'quase nada' em relação ao conhecimento de sua situação de saúde/doença. Nós da Psicologia, há muito sabemos e praticamos que o detentor do conhecimento sobre si é a própria pessoa que vive e  sente. Nós funcionamos apenas como veículos, como instrumentos facilitadores para a 'cura'. Desconhecer isso chega a ser patético.
Em muito já tínhamos avançado ao admitir que médico não é Deus. Agora, com o Ato Médico, parece que o médico travestiu-se de deus. E infelizmente, com certeza, muitos maus usos serão feitos em nome dessa 'divindade'. É esperar e confirmar.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

"...Que Não Seja Imortal Posto Que É Chama..."



"Eles se amam de qualquer maneira, eles se amam e é pra vida inteira...", dizem os versos da música Paula e Bebeto, de Caetano Veloso.
Viveram um amor intenso, de completa sintonia, como o amor deve ser vivido. Uma vez um amigo me falou a respeito do encantamento do amor: "Não dava pra 'arriar' só 2 pneus, tinha que ser os 4?", referindo-se à característica avassaladora com que o amor lhe invadiu.
"O amor me pegou", diz a música Quando o Amor Acontece, de João Bosco. Tem o mesmo sentido da frase acima. É maravilhoso amar. É maravilhoso ter um amor. É maravilhoso poder viver um amor. Sim, porque algumas vezes o amor não pode ser vivido. Parece inacreditável, mas acontece! São os chamados amores 'impossíveis'. E às vezes é melhor que sejam impossíveis mesmo. Melhor do que promover sofrimento, quando por exemplo, não é uma condição que abrange na totalidade os envolvidos. Eu dou, ele recebe e devolve. Algumas pessoas abrem mão desse amor completo para suceder à migalhas de amor. Conheci uma pessoa que fez bodas de prata - 25 anos - com um homem casado (com outra). Não dá pra ser feliz assim.
Nossa vida contempla vários aspectos. O social, o profissional, o familiar, o financeiro, o amoroso e outros. Mas parece que o aspecto amoroso funciona como um regulador do psiquismo. Lembrando ainda do: "Parece que viu passarinho verde", que se refere a alegria que invade os apaixonados.
Amar é fácil, é natural, acontece. Relacionar-se é mais difícil. Demanda investimento, dedicação, conciliação. Quando vale a pena reunir todos esses atributos é só prosseguir. E não complicar. Recebo muitas pessoas em meu consultório 'mestres' em complicar o que é - ou deveria ser - simples. Inventam problemas, desgastam-se em pormenores e esquecem de aproveitar a situação, de viver o que lhes cabe no amor que lhes é oferecido pela vida. Sim, o amor é um presente. Sempre. Ouço essa frase muito assiduamente e acredito ser assim. Imagine o que é passar uma vida 'em branco', sem amar e sem amor. Ninguém quer ser protagonista de uma história assim. A propósito, a Paula e o Bebeto reais, que inspiraram a música, não ficaram juntos em um happy end, mas fizeram valer o "que seja infinito enquanto dure". (Vinícius de Moraes).