segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Psicoterapia: Desafios e desafiados.




O interessante em se trabalhar com Psicologia Clínica é que ela contempla muitos saberes. A fim de atuar com essa prática, temos que entender ou pelo menos conhecer, de tudo um pouco, a fim de promover empatia e facilitar a comunicação. Mas esse não é, definitivamente, hoje, nosso maior desafio.
O trabalho psicoterapêutico não se apoia em um exercício de convencimento do outro; visa ajudar o outro a enxergar verdades obscuras, escondidas, não reveladas. Contempla o objetivo de recapturar o que ficou perdido pelo embotamento das emoções ao longo do tempo. Muitos fatores concorrem para que esse processo de escamoteamento das emoções ocorra.
Vivemos em uma época onde é proibido sofrer; sofrer, mesmo que o mínimo necessário para o crescimento pessoal, é visto como sinal de derrota; vivemos em uma sociedade de aparências, onde certamente o que tem mais valor é sempre o que é visto e não o que é sentido.
Os cientistas das humanidades, após muito penar, por assim dizer, descobriram, que o que realmente importa é o conhecimento que se tem sobre si, ou seja, quanto mais eu sei sobre mim, mais terei acesso à minha satisfação; hoje, ao contrário, o ser humano tem medo do que ele pode 'enxergar' dentro de si; parece que as verdades perderam a importância.
Em meio a esse conflito interno envolvendo nossas verdades, vivemos na artificialidade. A qualquer preço, evitamos nos defrontar com nossas verdadeiras dores, daí explicada, por exemplo, o 'sucesso' das drogas, tanto as chamadas 'lícitas', já que ninguém pode sentir mais nada sem imediatamente se medicar, quanto às 'ilícitas' com suas falsas promessas de felicidade.
É nesse cenário que reside o grande desafio do trabalho psicoterapêutico atualmente. Como ajudar esse ser humano, totalmente 'conflitado', e não bastando, bombardeado pela suposta felicidade alheia, e fazê-lo reconhecer o que ele não quer ver?
Sim, porque é nesse binômio que encontramos as nossas certezas diante das inevitáveis incertezas da vida.
Para complicar, desenvolveu-se a ideia de que quase sempre o sujeito está deprimido, com desregulagem de serotonina, precisando recuperá-la e... toma-lhe antidepressivos!
Se você está atingido pelos percalços da vida, e sofre por isso, o que podemos afirmar é que você 'sai na frente', está ganhando, você ainda não foi cooptado pela visão (errada) de que temos que ser 'fortes' sempre; de maneira alguma podemos afirmar, por esta razão, que você está deprimido. Depressão é uma das situações emocionais a que se há de fazer um completo e seguro diagnóstico diferencial, a fim, inclusive, de não sermos cúmplices na promoção do embotamento, tão prejudicial, das emoções. Eis os desafios da psicoterapia hoje. Mas, apesar de todas as dificuldades e incertezas, como o próprio elemento incerteza que pauta a nossa vida, a psicoterapia pode seguramente ser declarada como uma poderosa ferramenta de acesso ao desconhecido mundo interno de cada um de nós. Inspirada em Lacan, eu afirmo: Após fazer uma análise, eu vejo a minha vida escrita. E conseguirei escrever os próximos capítulos de maneira mais fácil, assertiva e, quem sabe, feliz!

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Diferenças



Difícil aceitar o diferente. Conceituado aqui como algo que diverge de meu modo de pensar, de agir. Difícil assumir que pessoas podem sentir eventos de forma particular, única. Difícil respeitar a subjetividade, muitas vezes confundida com individualismo.
Sabemos que opostos se traem, mas são os semelhantes que se mantém; ser semelhante em algo, não significa ser igual; cada um vai, e tem o direito, de 'funcionar' como bem entende.
Exercer a diferença, compactuar com divergências, administrar contrários, é uma tarefa árdua, principalmente quando algum dos lados envolvidos apresenta dificuldades ou mesmo impedimentos em olhar seus movimentos.
As maiores dificuldades manifestam-se nos relacionamentos com pessoas próximas; se meu vizinho, com quem não troco nem um bom dia, pensar diferente de mim, pouco me importa, mas se meu núcleo se porta diferente do que eu acho coerente com minha visão de mundo, aí a situação toma outra proporção.
Essa condição surge na maioria das pessoas porque estas não foram acostumadas a entender que, na vida, existiriam sempre modos e maneiras particulares de pensar e de agir. Muitas dessas pessoas, por não contarem, por assim dizer, em seu repertório, com a presença do 'diferente', (diferente à mim, ao meu modelo, à meus paradigmas), boicotam, castram, rejeitam, abominam, tudo o que diverge.
Passamos enquanto humanidade por tanta coisa, que deveria ser dispensável discutirmos (ainda) essa questão; a retórica dos intolerantes é sempre baseada na dominação de suas 'realidades'; sim, porque o que estes querem é impor aquilo que eles consideram real; nesse cenário, não existe espaço para o amarelo, pois tudo é azul... A realidade é vista unilateralmente, sem contemplar a dinâmica que a vida abriga, sua pluralidade. Essa semana disse em sessão que situações nunca são provocadas de forma 'unicausal', ou seja, uma causa para um resultado, uma condição. Tudo é multifatorial, sempre. Quem nos dá essa lição é a própria natureza; para que uma flor ou um fruto nasça, antes observamos uma série de fatores atuando de forma sequencial ou às vezes em conjunto. É interessante ver como muitas vezes nos deixamos levar, na vida,  por situações cotidianas e nem paramos para pensar no que pode estar provocando resultados inesperados, por vezes desgastantes.
O ato de pensar é trabalhoso, por isso que, se observarmos, na antiguidade, essa era a 'tarefa' dada a filósofos; pessoas ditas 'comuns', leigos, não se atreveriam à essa façanha; hoje porém, pensar tornou-se 'estratégia de sobrevivência'; temos que pensar primeiramente sobre nós, sobre nosso funcionamento, sobre a condução que estamos dando para as nossas vidas; depois, de forma gradual, começar a ampliar essa visão, saindo de nosso quadrado (aquele que minimamente controlamos) e tentar entender o movimento das pessoas que nos cercam. Não daquele vizinho que não damos nem bom dia, mas pelo menos daqueles com quem de alguma forma dividimos a vida.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Solidão a Dois



Talvez a pior condição amorosa que um ser humano pode ter, a solidão a dois parece ser mais comum do que se imagina. Casais que aparentemente vivem juntos um amor muitas vezes invejado, em um bom sentido, pelo que os cercam, podem estar camuflando para eles próprios, a real situação em que se encontram, afetivamente falando.
Viver um amor durante um determinado tempo, com tudo o que um relacionamento pode contemplar (de bom e de ruim), parece ser privilégio da minoria. Em um momento de relacionamentos descartáveis, conseguir a 'proeza' de ser feliz e proporcionar felicidade a seu par afetivo, está mais difícil do que acertar os números da mega-sena!
O investimento amoroso sempre mobilizou o ser humano; Vinícius cantou ser impossível ser feliz sozinho! O que dizer, então, de quem 'escolhe' aceitar uma condição de solidão a dois? Por que algumas pessoas preferem enfrentar um relacionamento infeliz, que nada mais lhe oferece de bom, do que enfrentar a vida lá fora, onde possivelmente estão as possibilidades de resgate da própria felicidade?
Sabemos o quanto é difícil para nós lidar com o 'fim' de qualquer coisa. Fim de um namoro, fim de um casamento, fim de uma amizade, fim da juventude, fim do sucesso, fim da estabilidade, fim do emprego, etc, etc.
Esse apego ao que vamos construindo ao longo de nossa vida, pode ser a maior cilada. Sem que consigamos perceber, vamos nos acomodando à 'ordem' estabelecida e com isso não nos permitimos viver novas emoções; ficamos 'mortos-vivos', alimentando-nos do que já temos, mesmo que o que 'já temos' não represente verdadeiramente mais nada.
O medo do enfrentamento de uma situação nova também é um fantasma que atormenta e impede a mudança. Infelizmente, esse medo não se dá apenas na área afetiva, ele permeia nossa vida. Lutar contra essa característica tão humana, aliás, deveria ser nossa meta número um, aqui nessa passagem.
A falsa sensação de segurança é outro entrave para enxergar a situação como ela realmente é. A sensação de sentir-se protegido é a 'cereja do bolo' nos relacionamentos falidos. O comodismo à uma situação conhecida, a falácia da estabilidade; e pensar que nem a vida é estável, quanto mais os relacionamentos! É por pensar assim, que muitos casais chegam a um abismo, onde não há diálogo, e assim não há como identificar quais problemas atingem, separadamente, os indivíduos (sim, são indivíduos, individuais), nesse par. Afastando-se de nossas expectativas, vamos cavando dia a dia o poço da insatisfação, além de projetarmos, injustamente, no outro, a culpa pela nossa infelicidade. 
São muitas as implicações na situação de afastamento entre os casais, porém, ao desistir da relação, passando a dar menos valor ao relacionamento, certamente iniciamos o processo de instalação, gradativo e imperceptível, da solidão a dois.


segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Os Homens Idealizam o Amor?





Estatisticamente, ainda hoje, parece ser o sexo feminino o mais atingido em idealizar o amor. Apesar de todas as conquistas das mulheres na condução de suas próprias vidas, o amor ainda é um aspecto idealizado pela maioria delas.
Precipitadamente pode-se pensar que, ao contrário, os homens não tem um ideal de amor. Grande engano! Os homens também idealizam a parceira ideal. E ela não é comum, não! Muitas vezes exigentes, outras desligados ao extremo e, ao firmar um relacionamento mais sério, estilo 'casamento', acabam, como grande parte das mulheres vendo seu 'ideal' não se confirmar.
Certa vez em uma palestra, o psicanalista Contardo Calligaris falou que casamos (falava de homens e mulheres), para culpar o outro pelo que não conseguimos ou conseguiríamos realizar. Funciona assim: "Por causa de vc não fui trabalhar naquela empresa; por sua culpa engordei; por sua culpa não tenho amigos". Completo: Por sua culpa não sou feliz!
Sim, porque esse é o resultado número 'um' das idealizações: As decepções!
Seres humanos são falhos, sempre seremos. Quando imaginamos um ser idealizado, como em uma grande fantasia, estamos 'quase' certamente fadados à decepções.
No caso do ser 'masculino', é sabido que quase 100% deles são criados para serem 'super'; não 'super- alguma coisa', mas sim 'super-tudo'.
Por conta dessa imensa expectativa que os pais 'jogam' para seus meninos, na construção desse ideal do amor romântico, a figura feminina, sua parceira, invariavelmente deverá corresponder à essas expectativas. Para ampliar ainda mais a complexidade dessa questão, tem-se as expectativas dele sobre ele mesmo; o que ele desenvolverá, o que ele conquistará (ou não, tanto pior), na vida. Aliás, é por isto que muitas vezes conseguimos facilmente rastrear pessoas aparentemente sem nenhuma razão para serem infelizes (portadores de dinheiro e sucesso), mas imensamente infelizes em seu mundo interior, como se algo não 'batesse'. Vivem uma difícil relação com o mundo concreto que os cerca e para manterem-se "ajustados", utilizam-se das diversas promessas de felicidade disponíveis, incluídas aí drogas ou álcool em excesso. Como se não conseguissem 'segurar a onda'.
Será que esses homens, imbuídos em sua maneira de gerir seu próprio mundo, conseguem observar o que eles tem (ou teriam) a perder ou a ganhar, agindo de uma ou outra maneira?
Todas essas questões influenciam e definem como o homem idealiza o amor. O que se 'espera' dele, aí incluídas as expectativas maternas e as expectativas do social que o cerca, amigos, concorrentes e até desafetos (isso, muitos deles, homens, são chegados a impressionar até seus desafetos; quanta complicação!). Parece que assim fica mesmo difícil ser feliz.

domingo, 24 de agosto de 2014

'Grand Final'.




Acabo de ler um texto impressionante pelo seu realismo! Sobre ela, aquela que nos espera um dia: A morte! A morte e seus 'comemorativos'. Não no sentido festivo, não no sentido médico, e sim no sentido de fazer alusão à, no sentido de envolver a questão (da morte).
Pensar em morte nos leva inevitavelmente a pensar em vida, em como deveríamos proceder até nosso grand final. 
Temos um certo preconceito em falar de morte, em sequer pensar nela. Observo que há, em grande parte de nós, os seres humanos, um discreto desejo de se tornar imortal; seja através de nossos feitos, nossos filhos, lembranças, marcas, etc. já que através da própria vida é impossível, diante da irrefutável realidade de que todos nós morreremos um dia.
O texto 'O Mundo da Gente Morre Antes da Gente', da jornalista Eliane Brum, descreve, com um grau inequívoco de assertividade, como o desenrolar da vida confunde-se com a inevitabilidade da morte. Como os planos que fazemos podem ficar no meio da estrada, como o inesperado pode estar esperando na esquina. Cita vários desses imprevistos, de pessoas que não conseguiram cumprir a  agenda, de pessoas que nem tiveram a oportunidade de sequer sonhar o sonho daquela noite porque a morte os esperava. 
Fala das pessoas que buscaram a morte, por de alguma forma não conseguir sustentar a realidade de sua própria existência; fala de quem envelhece, fala de quem adoece, fala de quem, buscando dar uma 'desligada' da vida, errando a dose, se foi para sempre...
Interessante também a abordagem que ela dá aos efeitos de outras mortes em nós, como de certa forma morremos um pouco, porque alguns nos precederam. Parece até cruel, usar esses termos pesados, mas o que haverá de bom, de positivo, ao se falar de morte?
A meu ver, o primeiro objetivo positivo, está em criar uma oportunidade, para, a partir do 'pensar' sobre a morte, podermos 'checar' sobre a vida. Buscar captar como estamos vivendo, e 'se' estamos vivendo!
Sim, porque parece que muitas vezes 'viver' poderia ser facilmente substituído por preocupar-se exageradamente, gritar, tratar mal as pessoas ou deixar que elas nos tratem mal, guardar além das 'previdências', tolher o prazer, exagerar nos preconceitos, ativar moralismos decadentes, esquecer de se olhar (muitas vezes ativando o olhar para a vida alheia) e por aí vai...
Se, ao pensar acerca da morte, conseguirmos fazer um mergulho de reconhecimento em nossas vidas, valerá muito à pena!
À certa altura da vida, vale mesmo perguntar: "Como nosso mundo morre antes da gente?". Além de todas as já mencionadas considerações, nosso mundo começa a morrer quando desistimos de viver e apenas existimos, dia a dia, numa rotina repetitiva e interminável; quando não damos chance ao acaso, aquele acaso que nos surpreende positivamente, quando deixamos os rigores nos engessar, enfim, quando não estamos pro que 'der e vier', como toda valiosa existência exige!

sábado, 16 de agosto de 2014

Emoções à Flor da Pele


A pele é o nosso maior órgão. Embora a maioria das pessoas veja com certa estranheza a pele como um órgão. Órgão parece ser algo localizado, inclusive com aspecto visual determinado, enquanto a pele é envolvente, nos serve de casulo, é o invólucro de todo nosso organismo.
A despeito de ser nosso maior órgão, a pele sofre influência direta das emoções; quando atingida por emoções negativas ou por estressores, pode desencadear um problema de difícil e demorada solução. A pele aparenta, apresenta, molda, expõe, irrita, coça, queima, avermelha, enfim, através dela facilmente visualiza-se a saúde emocional. Não à toa referimos: "Quando você está feliz, sua pele brilha, 'irradia' felicidade". O contrário é verdadeiro: Quando atingidos por sofrimentos psíquicos, situações emocionalmente dolorosas, a pele pode 'responder' sob diversas formas; das mais brandas às mais agressivas.
Não raramente há que se fazer uma mudança radical no estilo de vida (emocional e físico), para que se obtenha alguma mudança positiva em determinadas doenças dermatológicas. Quem nunca ouviu falar de dermatite de 'fundo' emocional, por exemplo? Embora o termo já deveria ter caído em desuso, visto que, definitivamente, seria mais útil compreender que somos um só ser, não cabendo mais essa divisão nos modelos cartesianos.
Nosso corpo 'fala' sobre o que vivemos e como vivemos. Se felizes estamos, levando a vida com uma relativa dose de satisfação, vamos seguindo adiante, sonhando e realizando, transformando expectativas em realidades. Quando 'carregamos' a vida, muitas vezes esta representada por um fardo além de nossas capacidades, abrimos portas para problemas de saúde, alteramos nosso equilíbrio. 'Mexemos' com nossa imunidade, pois não são só vírus e bactérias espalhados por aí que nos atingem. Surpreendentemente, podemos até afastar alguns deles se estivermos fortalecidos. Não é magia, é Ciência! 
O problema é que os olhos muitas vezes veem na superficialidade, como se não conseguissem conectar a realidade apreciada visualmente às abstrações que dela também fazem parte. O que vemos é muito pouco; há que se sentir! Observar o que está inerente, não apenas o que está aparente. As aparências são sempre o reflexo de algo maior e dominante; para o bem e para o mal, digamos assim.
Sempre coloquei para as pessoas que atendo: Não fique com raiva de seus sintomas; eles têm um bom objetivo; lembrá-lo de que algo não vai bem. E no caso da pele, mostrar!

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Melhor Se Conhecer




Embora esteja errada, a grafia do título é proposital. Visa chamar atenção para algo fundamental na vida. Conhecer-se evita problemas, cria oportunidades, amplia as chances de sucesso na vida. Entendendo sucesso sempre como 'ser feliz'; nunca o sucesso aparente, sempre o interior, o que faz 'brilhar' a alma.
Conhecer a si mesmo proporciona o conforto de se saber o que fazer, pois as reações já são esperadas e conhecidas. O autoconhecimento faz com que o entorno que nos cerca não seja nunca ameaçador; ao prever nossas reações, adquirimos possibilidades de melhor controlar os percalços, as dificuldades que invariavelmente temos que enfrentar.
O autoconhecimento também eleva nossa autoestima, já que teremos melhores condições de identificar e analisar nossas limitações e assim atingi-las mais facilmente superando nossas incapacidades.
Como consequência final do autoconhecimento, temos mais qualidade de vida, pois não perderemos tempo com o que não nos interessa, não nos acrescenta. Sabiamente, conseguimos triar o que nos favorecerá, construindo relações de troca que implicam em um maior contentamento em nossas vidas. Quando, ao contrário, não sabemos 'a que viemos, quem somos', ficamos perdidos em meio às opções que surgem no caminho, muitas vezes fazendo escolhas aleatórias que resultam em grandes problemas. 
A vida é muito curta para que possamos brincar com nossas escolhas; quanto mais cedo conseguirmos captar como somos, mais rápido chegaremos a nossos objetivos em todos os aspectos da vida. 
O autoconhecimento é tão importante que ele chega a influenciar até mesmo nossa relação com as pessoas; quem convive com alguém que tem a capacidade de 'enxergar-se' mais facilmente, colhe vantagens, por assim dizer, desse convívio. Quem se conhece consegue objetivar, traçar finalidades concretas, nunca sem perder as nuances de suas próprias abstrações. Sim, porque só quem  se conhece bem é capaz de abstrair o que está 'por trás' de seus desejos e fazer que tudo trabalhe a seu favor. É um longo processo, dura a vida toda, amplia-se e sofistica-se todos os dias. Não é fácil, por vezes chega a ser doloroso, mas, seguramente, nada vale mais a pena.

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Desejo

                        
Foto de Felipe Ventura.
Desejo, em Psicanálise, é um conceito complexo e difuso. Desejo vem a ser uma espécie de ‘insistência’ na vida, um eixo que nos conduzirá (e contraditoriamente, também não) a tudo o que fazemos ou deixamos de fazer. Somos sujeitos ao mesmo tempo conduzidos e ‘não-conduzidos’ pelos desejos.
A variedade de conceituações acerca de desejo em Psicanálise define sua característica difusa. O desejo pode ser simétrico, assimétrico, transparente, recalcado, enigmático, reprimido, consciente, inconsciente, e provavelmente, eu poderia encher uma ou mais laudas desse texto só nomeando conceituações de desejo.
O desejo tem lugar. E lugar de destaque em todo ser vivente, mesmo naqueles que não têm consciência do que querem. O desejo está ligado à felicidade e à infelicidade. O desejo só não sofre de omissão, ele é sempre ‘posto’, mesmo quando encoberto; ele nunca erra, sempre aponta para os verdadeiros fatos, para aquilo que realmente interessa.
Por tudo isso, o desejo nunca é mentiroso, nunca uma falácia. É sempre puro e verdadeiro, mesmo quando negado com todas as forças de quem o tem. Por vezes (e às vezes muitas), ele se esconde, se disfarça, se camufla, mas de repente eclode e ‘trai’ quem o nega. Quanto mais tardar a reconhecê-lo, acatá-lo e aceitá-lo mais tempo vai, e se esvai nos meandros dessa complexa teia que envolve e emaranha nossa vida.

O desejo é realizado, para logo dar lugar a outro, importante e fundamental processo para o psiquismo, pois sem o desejo, estaríamos ‘mortos’, emocionalmente falando. Precisamos reconhecer quando o desejo se apresenta e suas (às vezes presentes), impossibilidades de realização; precisamos contar com a falta, lugar absoluto em nossas vidas. A sobrevivência emocional vem da resolução dessa equação permanente, o equilíbrio entre desejo e sua realização e a falta, o ‘buraco’ sempre presente representado pela angústia, que nunca nos abandonará enquanto vivermos. Como disse Lacan, passamos a vida a indagar ‘o que quero?’, “o que o outro quer de mim? Respondendo essas perguntas temporariamente e nos angustiando com a volta delas sempre que achamos que estas foram devidamente respondidas. Assim, vivemos a vida e ficamos sempre em brancas nuvens. É o preço que pagamos por esta armadilha do desejo!

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Vida Leve

                                                        

O que faz a vida leve? Como conseguir passar por ela, fazendo-a fácil de ser vivida e colhendo doces frutos ao longo de suas estações? Como desfrutar de todos os momentos sem o peso das obrigações? Qual o segredo para compartilhar o que apreciamos e ‘pegar leve’ nos dissabores?
Parece difícil, senão impossível, responder com relativa assertividade a todas as perguntas acima! Mas, ao situarmos nossa responsabilidade na condução de nossas escolhas, das mais banais e simples, às mais complexas, as respostas acimas fluem naturalmente nos dias que formam o que chamamos de ‘nossa vida’.
Já é conhecida e propagada a tendência que temos de complicar tudo. Não percebemos, mas elevamos quase tudo ‘à quinta potência’. Com esse funcionamento ficará difícil imprimirmos leveza à vida. Queremos carregar o mundo nas costas, conduzimos nossa rotina à exaustão, implicamos com os mínimos detalhes, nos esquecemos de sonhar. Não o sonho romantizado, mas o sonho real, passível de se viver. O sonho que nos direciona ao desenvolvimento, a sairmos da condição de expectadores para a condição de agentes, o sonho que nos tirará da definitiva imobilidade e nos conduzirá à transformadora mudança.
Ao engessarmos na vida, nos protegemos dos erros, nos escondemos das dores, porém com essa ‘atitude’ desperdiçamos as inúmeras oportunidades que se criam quando avançamos, sem medo, sem fantasias negativas e destruidoras. Viver é inevitável. É chegada a hora de fazer a vida trabalhar a nosso favor, tornando-a leve e não um fardo carregado ao longo de anos. Uma pequena dose de coragem e uma grande dose de desprendimento se fazem necessárias para que possamos transformar o peso de uma realidade insatisfatória, na leveza de uma vida inequívoca e feliz, sempre dentro de um padrão único e singular de felicidade, o seu!

sábado, 5 de julho de 2014

"É Inútil Plantar Um Carvalho Na Esperança De Poder, Em Breve, Se Abrigar Sob a Sua Sombra". Antoine de Saint Exupéry.


Carvalho Angel Oak, 1.300 anos de idade, Atlanta, Geórgia - EUA.
Embora Antoine de Saint-Exupéry tenha se expressado em relação às relações afetivas que construímos, quando cunhou uma das mais célebres frases de 'O pequeno Príncipe', esta me serviu de inspiração para pensar a cerca da urgência que se tem em 'colher' resultados na vida, nas mais diferentes áreas.
Ontem em sessão, discutia a necessidade de se plantar, regar, cuidar, para posteriormente, e às vezes muito posteriormente, em um tempo considerável, começar a 'colheita'.
Hoje vivemos em tempo acelerado, no modo fast, sempre correndo... Dessa forma, parece natural que esperemos resultados também rápidos para as ações que empreitamos. Não queremos mais plantar, queremos que milagres aconteçam; dormimos de um jeito e queremos acordar de outro.
Pressa é a palavra chave. Sem compreender que, como o carvalho, que precisa das intempéries para se transformar em uma árvore grande e forte, tão forte que suas raízes e troncos absorvem da forma mais positiva possível as consequências do que ela enfrenta, os seres humanos também se constroem, destroem (por assim dizer) e reconstroem-se ao longo do enfrentamento de suas dificuldades. Na linha de: 'o que não me mata me fortalece', de Nietzsche.
Nada se desenvolve da noite para o dia. Nem o que é bom nem o que é ruim. Tudo necessita de um processo. Entender essa lógica é sinal de sucesso futuro. Saber planejar, plantar, cuidar, resistir. Quando os passos desse processo são caminhados de forma tranquila, a chance de colhermos o que queremos multiplicam-se aceleradamente. 
Se pensarmos que os grandes feitos da humanidade foram resultados de persistência, de calma, de obstinação até, concluímos que não adianta correr em direção aos nossos objetivos de forma 'atropelada'; cabe-nos resistir, entender que das dificuldades enfrentadas emergem oportunidades de crescimento. Quanto mais situações adversas são enfrentadas, cada desafio, cada tempestade, cada inverno, como o carvalho, mais fortes podemos ficar. A palavra 'podemos' é proposital, pois só colherá este fruto quem apostar na insistência. Sem pressa, sem pressão.

domingo, 29 de junho de 2014

'Hoje o Tempo Voa Amor, Escorre Pelas Mãos'... Lulu Santos em Tempos Modernos



A impressão que tenho é que hoje vivemos em um ritmo ultra acelerado, onde o tempo nos faz avançar mais e mais em direção ao que temos, queremos e às vezes até o que não queremos fazer.
A administração de nosso tempo é um constante desafio, já que temos que viver em vários espaços, com várias pessoas, em diferentes situações.
Como otimizar o tempo a fim de que nós mesmos não façamos ele nos trair, nos prejudicar, nos fazer sentir como se fôssemos seus reféns e ele, senhor absoluto de todas as coisas, de nossa vida?
A primeira grande atitude nesta direção é conseguirmos observar como estamos utilizando nosso tempo. Ele 'trabalha' à nosso favor ou contra nós? Como equilibramos o tempo dispensado às atividades formais da vida (estudo, trabalho, sono, cuidados pessoais, deslocamentos) e o tempo dispensado a nosso prazer, nosso contentamento, nosso investimento pessoal em atividades que nos acrescentam de forma subjetiva (o que gostamos de fazer)?
Muitas vezes o 'automático' é ligado e caímos na cilada de viver um dia atrás do outro, como se participássemos de uma 'linha de produção' de uma fábrica chamada vida! As perdas só serão constatadas mais tarde, quando esse tempo transcorrido no 'automático' tiver avançado. Quando envelhecermos, quando olharmos para trás e constatarmos quanto tempo empreendemos e perdemos nas atividades automáticas e quanto tempo deixamos de viver com o que nos traria prazer e contentamento.
As perdas de nosso tempo útil comprometem o total do tempo que dispomos para tudo e como nosso tempo de vida é limitado, seria interessante começar a viver o que realmente interessa hoje, se possível agora.
O tempo é gratuito mas, por ser limitado, é valioso. Momentos preciosos são sempre bem vindos, pois alimentam nossa existência fazendo nossa 'passagem' aqui, na vida, valer à pena. Frações de segundos que nos envolvemos em situações felizes, fragmentos de momentos que dividimos com aqueles que amamos, tempo empregado em leituras prazerosas e nem sempre fáceis, quando nos debruçamos a estudar algo complexo, que temos a impressão de que para 'captar' de forma 'fechada' precisaríamos extrapolar o tempo de nossa existência atual. Todas essas situações corroboram e dão sentido ao tempo em que vivemos. E viva a vida! Vamos fazer valer o tempo do aqui agora e o tempo que nos resta.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Relacionamentos Tóxicos



Nome sugestivo para aqueles relacionamentos que oferecem mais dor do que prazer, que acumulam mais tristezas que alegrias, que proporcionam mais tensões do que tranquilidade.
Já temos certeza que nós, os seres humanos fomos 'projetados' para nos relacionar com uma 'cara metade'. A grande maioria de nossa espécie, ao menos uma vez na vida tem uma experiência amorosa/afetiva. Não significa dizer que é impossível viver sozinho, mas ter uma troca afetiva na vida nos proporciona um aumento de contentamento e felicidade. Pelo menos deveria ser sempre assim. Mas não é!
Por ingenuidade, baixa auto-estima, falta de cuidado, desatenção e outras milhares de razões, muitas vezes nos relacionamos com pessoas que nos trazem de um tudo, menos a calmaria de um relacionamento afetivamente qualitativo. Será possível se proteger de relacionamentos assim? Certamente, é a resposta.
Vivemos em um mundo onde as melhores qualidades são expostas de forma  bastante explícita, enquanto os defeitos, aqueles que todo mortal possui, não constam em nosso cartão de visita. Isso já faz com que passemos uma imagem não tanto fiel de nossa realidade. Fora isso, que eu diria acontecer em uma esfera mais 'normal', existem pessoas que são narcisistas, controladoras e manipuladoras, inicialmente não declaradas, porém com o tempo de relacionamento essas características antes camufladas vem à tona, em geral quando já está instalado um envolvimento afetivo da 'vítima'. Sim, porque cabe a denominação. Do lado de pessoas com essas características tão negativas de personalidade, sempre há uma vítima. Como diz a música "É preciso estar atento e forte"...
Quanto à frase da música, ainda tem esse 'outro lado': A baixa auto-estima das pessoas que se deixam manipular por esses indivíduos que encontram um terreno fértil para montar sua estratégia de destruição, que é o que muitas vezes os relacionamentos tóxicos causam. Um verdadeiro esfacelamento do ego de quem passa pela situação é o resultado que ocorre. Voltar a se relacionar de forma saudável depois do abalo provocado torna-se difícil, com a pessoa desenvolvendo muitas vezes uma tendência à repetição, envolvendo-se com o mesmo tipo de pessoas. Ou, de forma oposta, a vítima pode criar uma tendência ao isolamento afetivo, desenvolvendo medos irracionais e com extrema dificuldade de confiar novamente em alguém. O estrago é sempre grande!
Relacionamentos tóxicos são destrutivos, provocam violências psicológicas importantes e na maioria das vezes, sem ajuda terapêutica, os envolvidos não mudam. É em um ambiente psicoterapêutico que tanto o manipulador, verdadeiro destruidor da felicidade alheia, quanto a vítima, sabotadora de sua própria felicidade, podem encontrar-se com seus 'eus' sem disfarce e iniciar um processo que acarrete na (re)construção de seus desejos e expectativas na esfera amorosa. 


sexta-feira, 23 de maio de 2014

" A maior felicidade das pessoas ainda é quando conseguem estabelecer vínculos amorosos de qualidade". Flávio Gikovate.



Lendo um artigo sobre consumismo no Brasil da atualidade, focalizando principalmente na nova elite brasileira, os chamados 'novos ricos' e seus exageros 'gastatórios', no qual o psiquiatra e psicoterapeuta Flávio Gikovate aponta com muita assertividade as causas e caminhos da felicidade e/ou infelicidade desse grupo, inspirei-me a traçar algumas considerações sobre um tema sempre recorrente, a importância do dinheiro ou de sua falta na vida dos indivíduos e quanto somos norteados e direcionados ao simbolismo que ele ocupa na sociedade atual.
Apesar de estudos em Harvard apontarem para a impossibilidade de sermos felizes sem termos garantidas as nossas necessidades básicas, como saúde e alimentação (o que no meu entender qualquer ser humano com um pouco mais de sensibilidade reconheceria, para si e para os outros), na contramão desses resultados, parece que em um nível de maior acúmulo, o dinheiro provoca mal estar e infelicidade. Surpresos? Pensem um pouco e talvez responderão: "Nem tanto".
O dinheiro pode atrair pessoas para quem o tem (aí, infelizmente todo tipo delas, inclusive os invejosos, os falsos amigos, etc), e pode também afastar as pessoas, quando, pelos mais variados motivos, o dinheiro resulta em elemento desagregador, tornado a pessoa que o tem como um ser diferenciado para as demais, muitas vezes porque o próprio 'endinheirado' julga-se diferente, para melhor.
Engana-se quem pensa ser dinheiro sinônimo correto e direto de felicidade. O que é pior, engana-se 'redondamente', engana-se muito! Dinheiro não é patrimônio de felicidade!
O dinheiro pode ser o elemento mais estressor para quem o tem, quando estas pessoas desenvolvem uma relação de apego com ele, por exemplo. Quando o acumular passa a ser doentio, passa a ser mais fundamental do que aproveitar os benefícios que ter um pouco mais de dinheiro traria. Ou, ao contrário, quando as pessoas exageram num consumismo sem noção e sem fim, muitas vezes acumulando coisas que não precisam, que não usufruem, que não tem prazer nenhum em ter. Compram para ostentar, mostrar, exibir e o desejo ligado ao objeto inexiste. É um movimento repetitivo infindável, produtor, no final das contas, de um imenso vazio. Vazio este que apenas os sabores e dissabores dos relacionamentos entre as pessoas poderia produzir. Parece que foi para isso que fomos projetados e, como conclui Flávio ao final de seu artigo e que dá título a este texto: "A maior felicidade das pessoas ainda é quando conseguem estabelecer vínculos amorosos de qualidade". Complementando, talvez esta seja a verdadeira loteria da vida!

quinta-feira, 22 de maio de 2014

A César O Que É De César


Já repararam que existem pessoas que nos 'presenteiam' com o que não nos cabe? São recorrentes na vida situações onde estamos sendo atingidos por agressões sem merecer. Sentimentos negativos deslocados de seu objeto alvo original e que causam no mínimo, um máximo desconforto a quem os recebe (o trocadilho é proposital).
O fato descrito acima ocorre porque algumas pessoas não se 'vêem', isto é, desconhecem totalmente seu movimento psíquico, suas motivações, seus desejos, suas frustrações, suas insatisfações na vida. Este fenômeno - o de que nossa vida não é um 'mar de rosas' - deveria ser encarado com mais naturalidade, sem os dramas excessivos que em geral permeiam essa constatação.
Precisamos de uma dose de desassossego, de contrastes, de lutas, de decepções, até para movimentar a vida, para sentir que podemos nos desenvolver, fortalecer e crescer. A vida perfeita seria um tédio, essa que é a grande verdade!
Aqui estamos para receber apenas o que nos pertence, seja para o bem ou para o mal, sejam elogios ou críticas negativas e não um pacote que não nos é devido. Se uma pessoa sofre alguma pressão em seu cotidiano de alguém e sente-se mal por isso, seu problema deve ser resolvido com esse objeto; se está com problemas em casa, resolva em casa, não leve para o trabalho! Ninguém tem culpa pela sua inoperância diante do seu 'objeto-algoz', resolva-se com ele! Mas, para que isto ocorra, é necessário um olhar atento para dentro (para as insatisfações resultantes da agressão cometida pelo objeto-algoz) e um olhar para fora (identificador das insatisfações produzidas pelo sujeito-vítima aos outros que nada têm a ver com o fato). Temos que saber identificar o que compete a nós receber, sob pena de nos distanciarmos cada vez mais do que merecemos na vida. Se aceito tudo o que me jogam (inclusive o que eu não deveria aceitar), vou encolhendo como pessoa, me submetendo ao bel prazer do agressor e comprometendo seriamente minha auto-estima. Quando, como uma válvula de escape inconsciente, projeto em meus próximos essas agressões desviadas, comprometo esses relacionamentos, afasto os que me querem bem por culpa das ações dos que me querem mal. É um enigma complexo de decifrar que muitas vezes só se desvenda em uma situação terapêutica.
Nossos problemas tem que ser resolvidos no aqui-agora com os objetos certos, sem deslocamento. 
Enquanto insistirmos na cegueira acerca de nosso funcionamento, ficamos expostos a todo tipo de violência psíquica, causando danos imensuráveis ao que teríamos que mais prezar: O nosso ser!




sexta-feira, 16 de maio de 2014

A Mãe é um Culpado Ideal



Seria a mãe a figura culpável ideal? Ela é responsável por nossas neuroses, nossa falhas, nossas tristezas...? indaga o site francês Psychologies.com.
Certamente influenciada por uma leitura superficial de certos aportes da Psicanálise freudiana, esta ideia difundida erradamente pelos mais desavisados que tentava anular e até mesmo ignorar outras influências no desenvolvimento infantil, quando sabe-se que na verdade e principalmente atualmente, a criança é cuidada por e para além dos limites do lar ou mesmo dentro dele, por muitas outras pessoas. Mas, sabemos como é comum a deturpação das teorias freudianas...
Inegavelmente, a mãe é nosso primeiro contato com o mundo, mesmo antes de nascermos, quando ainda somos esperados, desejados ou não. Estes desejos maternos concorrem para a futura relação entre a mãe e a criança determinando como essa relação vai 'funcionar'. Após o nascimento, inicialmente pela questão física, o amamentar, os cuidados iniciais que geralmente ficam ao encargo da mãe, fica estabelecido um maior vínculo com a mãe do que com qualquer outra pessoa que cerque a criança, mesmo sendo o pai mais participativo.
Observamos como foi desenvolvida a evolução das famílias e a consequente influência dessas mudanças ao longo da História na formação dos indivíduos. Toda e qualquer mudança na vida da mulher refletiu na formação de seus filhos, afirmação corretíssima. Com a saída da mulher para o mercado de trabalho, muito do que era oferecido às crianças foi abandonado, porém, como o saldo dessa mudança era uma mulher mais ‘inteira’, mais livre de neuroses, mais satisfeita consigo mesma e com o mundo que a cerca, me parece que as crianças ganharam uma mãe qualitativamente melhor.
Fácil nesse contexto ainda culpar a figura da mãe/mulher, indisposta para lutar muitas lutas a serem travadas pela autoria de uma situação que não lhes cabe. Parece que o tempo avançou historicamente falando e essa mãe/mulher deixou de ser culpada por uma razões, mas manteve a culpa por outros motivos.
Desde os amiguinhos na escola, professores, passando pela Publicidade, pela mídia, por tudo quanto esta criança é ‘bombardeada’ no seu dia a dia, tudo isso, junto e misturado, vai exercer influência decisiva na formação das neuroses desse futuro adulto. Inclusive e também, é claro, sua mãe.
Ainda bem que as mulheres avançaram tanto na condução de suas vidas que me parece não existir mais a demanda das mulheres culpadas por causar algo prejudicial aos seus filhos. Livres da culpa a elas imposta, puderam e podem crescer sem limites como pessoa, que é o que interessa à elas e certamente aos seus filhos.   

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Saindo Do Armário

A Atriz Jodie Foster e a Fotógrafa Alexandra Hedison - Foto Revista Veja SP.
A despeito de toda a 'força' que a mídia tem dado no sentido de tratar com respeito e sem preconceito o amor entre pessoas do mesmo sexo, que todos nós, mortais, cristãos ou não, sabemos que é bíblico, histórico, possivelmente pré-histórico etc... ainda temos pessoas que sofrem - e muito - em função de sua escolha sexual. Nem aprecio o termo 'escolha sexual'; uso-o para efeitos puramente didáticos. O termo correto seria escolha afetiva, amorosa, por 'totalizar' por assim  dizer, a questão. O termo 'escolha sexual' carrega, de forma inerente, um certo preconceito, pois relacionar-se com outro alguém, transcende o aspecto sexual. Inclusive esse termo, por si só, banaliza o amor ai envolvido.
Admitir e aceitar o diferente é, para a maioria das pessoas, em qualquer aspecto, difícil. Na esfera da sexualidade então, tudo fica mais complicado; é como se, ao perceber o mundo de uma forma mais global, as pessoas sentissem a necessidade de desenvolver alguma tendência. Calma! Ninguém precisa se desfazer de suas 'certezas' ao admitir as escolhas alheias, ao aceitá-las. O que queremos afinal? Viver num mundo de faz de conta, em uma bolha, onde só o que eu gosto, o que eu quero, o que eu admito existe, ou vamos viver em um mundo real, complexo, completo, que congrega diferenças de desejos, de opiniões, de afetos, de ideologias, de filosofias etc...? Por que ao invés de tentar dar sentido aquilo que não é seu, é do outro, faz-se questão de desqualificar, tornar objeto de repúdio?
É nessa interface entre o desejo e uma sociedade preconceituosa que se estabelece o sofrimento psíquico do indivíduo que ainda não consegue lidar publicamente com sua homossexualidade. Pesquisas indicam que a aceitação da homossexualidade depende do contexto social em que a pessoa está inserida, ou seja, quanto mais preconceituosa a sociedade, mais sofrimento para aqueles que ainda não conseguiram ultrapassar essa barreira. Amar não deveria ser tão complicado. Principalmente se cada um cuidasse de seu amor, de sua forma de amar e investisse tão somente nisso e não na forma de amar do vizinho...
Curioso perceber que muitos dos que 'criticam' homossexuais são mal resolvidos a cerca de sua própria sexualidade. Aquele velho complexo de 'não posso, ele (ela) também não'. Ser feliz parece ser, nesse cenário, privilégio de poucos. Dos que se assumem, dos que não têm medo, dos que não tem tempo a perder com os olhos críticos de pessoas que estão sempre de plantão para patrulhar a felicidade alheia. É privilégio daqueles que se concentram tão e unicamente no que querem para a própria vida. E viva o amor!

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Avanços?


NÃO!
Considerada como a característica mais marcante da história da humanidade nos últimos 300 anos, a aceleração dos avanços científicos e tecnológicos, parece, finalmente e contraditoriamente, nos ameaçar. Sem querer nem pensar que o fim do mundo está a um toque de dedos, muito embora confiemos que nenhum lunático possa ter alcance a este painel fatídico, é a tecnologia utilizada pelos simples mortais em suas atividades cotidianas que desponta como presságio de nosso fim.
Parece extremamente dramática a oração acima não? Mas, como num filme de ficção científica, coloquemos os fatos atuais como ilustradores desse temível futuro.
Hoje o ser humano sente-se cada vez mais conectado com tudo que o cerca mas está cada vez mais distante de seu interior. Quantas vezes observamos, em rodas de amigos, cada qual mexendo em seu novo brinquedinho, e distante dos demais? Não percebemos,  mas essa desconexão com nosso interior provoca uma profunda alienação sobre nós mesmos ao ponto de que quando precisarmos, em alguma situação mais séria, nos encontraremos despreparados. Viramos maquininhas teleguiadas?
A invasão da tecnologia em nossa vida não tem volta! São inegáveis os benefícios; sem ela, por exemplo, você não estaria lendo este texto no conforto de sua casa ou em seu local de trabalho, com um detalhe, o texto pode ser lido simultaneamente por um número sem fim de pessoas em qualquer lugar do planeta! Maravilhoso, porém não devemos colocar em risco o que já temos estabelecido. Os contatos presenciais, a troca de afeto, a garantia dos contatos que propiciam o verdadeiro aprofundamento das relações.
Quando a tecnologia está a serviço de nosso afastamento da vida real, ela produz resultados desastrosos. Será que casais não brigam por conta dela? Será que empresas não exploram seus funcionários por conta dela? Será que não estamos desperdiçando tempo útil com pessoas que amamos, como nossos filhos, por conta dela? O mais grave é que, na maioria da vezes, as pessoas não conseguem perceber o estrago causado pelo uso abusivo da tecnologia, e sem essa percepção, fica difícil uma contra-reação.
Esse movimento das pessoas, com um toque de cilada,  manifesta-se de forma a aliená-las de um mundo real que as cerca. Mundo este que nos envolve de maneira determinante. Os contatos virtuais não podem nunca ser mais importantes que os presenciais, pois o ser humano necessita dos contatos pessoais; esses, em um dado momento, tornam-se indispensáveis. Porém, como vivemos o aqui e agora, não podemos nos furtar de usufruir dos benefícios da tecnologia. Sendo assim, o segredo é construir uma interseção entre essas duas 'realidades' a fim de permitir o trânsito entre elas desenvolvendo um equilíbrio onde, a partir de todas as ferramentas que temos a disposição, possamos incrementar nossos relacionamentos. Fiquemos atentos para que a singularidade tecnológica* não ofusque, ou até mesmo destrua, nossa singularidade enquanto pessoas.
*Evento histórico previsto para o futuro, no qual a humanidade atravessará um estágio de desmedido avanço tecnológico em um curtíssimo espaço de tempo.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Humor




O humor nos salva. Se não fosse ele nossa vida seria 'apagada', sem brilho, sem cor, sem emoção. O humor funciona como um poderoso antídoto para as invariáveis dores ou dissabores que temos que enfrentar. Ele nos faz prosseguir. Quem consegue surpreender a si mesmo com uma boa dose de humor diante das adversidades, possui, certamente, um diferencial no que se refere a saber viver.
Não adianta se enganar. Quem vive sofre, se decepciona, se frustra, se estressa, Afinal, por estarmos vivos, estamos em constante ebulição. Então, o que poderíamos esperar ao levar uma vida com todos esses 'comemorativos', se não tivéssemos o alento do humor?
Você já reparou que pessoas bem humoradas são mais leves na vida? Comportam-se com uma espécie de savoir faire diante das dificuldades, não se opõem à elas, porém conseguem criar desvios, adiar preocupações, se desgastar menos, 'fazer dos limões uma limonada'.
Sabemos há muito que o bom humor influencia positivamente nosso sistema imunológico, atuando no sentido de nos livrar mais facilmente do 'lixo' que acumulamos, desde a má alimentação até o estresse cotidiano e inevitável. A liberação do cortisol e da adrenalina é necessária visto que o excesso desses hormônios está ligado ao aparecimento ou a piora de diversas doenças. Ou seja, mesmo com alguma doença já instalada, até mesmo o câncer, de forma indireta, é o bom humor que melhorará o indivíduo.
Existem pessoas que parecem ter vindo na vida a serviço. Sempre! São as pessoas 'pesadas', que não conseguem sorrir para nada, nem interiormente, e têm o poder maléfico de contaminar os que o cercam com sua antipatia, seu mal-querer. Essas, coitadas, cegas em seu tormento, passam toda uma existência sem se dar uma chance de melhorar, de se alegrar diante das coisas simples e gratuitas que a vida nos oferece, como a natureza, o sorriso ou os amigos. Mas, provavelmente pessoas assim com essas características não tem facilidade em atrair e manter amigos, muito pelo contrário servem como elemento repulsivo destes.
Ninguém quer estar perto de pessoas assim, amargas, difíceis. Para desfrutar melhor de nossa estadia aqui, procuramos nos aproximar de pessoas alegres, que conseguem no seu dia a dia identificar nas pequenas coisas o prazer de viver. Esses agraciados são certamente os bem humorados. Os que chegam e 'roubam' de maneira natural a atenção, por tão queridos que são. Ainda ontem escutei, em uma sessão, a descrição de uma dessas pessoas que, como dizia uma antiga paciente, só vivia de mal com duas 'coisas': Com Deus e com a humanidade. Era um pai que relatava o mau humor contínuo de seu filho jovem, sempre disposto a lançar 'patadas', gratuitamente. Que tal nos esforçarmos e percebermos que nossa vida é curta, que nossa convivência com as pessoas é efêmera e por isso deveríamos colocar o humor a serviço de nossas relações, sempre cultivando a alegria, a leveza? Não é um plano para viver acreditando neuroticamente que problemas não existem e que a vida é bela, irretocável. Longe disso! Porém, o objetivo é entender que temos como nos salvar dos fardos que passam por aqui de vez em quando. Como diz a canção, "a vida é bela, só nos resta viver".

sábado, 29 de março de 2014

Que Sociedade É Essa? Quem Somos Nós? (E o 'erro' do IPEA).


Tatá Werneck, atriz.
Os resultados estarrecedores da nova pesquisa do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), chamada Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPES), me fez indagar quem somos!
Do 'corpo' dos resultados, os que mais me chamaram a atenção foram dois:
- 65% dos entrevistados responderam que 'mulheres com roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas'.
- 58,5% dos entrevistados disseram que 'se as mulheres soubessem se comportar haveria  menos estupros'.
Diante do disposto acima, cabem algumas reflexões.
Não duvido que muitos dos que opinaram dessa forma, engrossam o grupo de falsos moralistas que, socialmente, na frente de suas mulheres, de sua família, de seu chefe, de seu guru, de Deus, ou de qualquer outro personagem que faça parte de seu cenário, demonstram-se ilibados, sérios e até demonstram posturas anti-humanas, assexuadas, monásticas, mas em seus mais 'puros' sonhos, em suas fantasias, sua psiquê mal resolvida, até culpem as 'periguetes' do metrô. Ao que me conste, em cidades praianas como no Rio de Janeiro, por exemplo, é comum a locomoção de mulheres por lugares públicos de forma, digo assim, mais descontraída, em trajes sumários, despreocupadas de que algum 'homem da caverna' possam atacá-las. Mas independente do local, nada justifica o ataque à mulheres. Seus trajes seriam motivo ou razão para alguém, na confusão interna estabelecida provavelmente por uma sexualidade mal resolvida, agredi-las, boliná-las, insultá-las, transformá-las em alvo de violência? Quem tem sua sexualidade mal resolvida em qualquer aspecto que seja, deveria iniciar um processo de reconhecimento do problema, que em geral é bastante complexo, muitas vezes com sua origem na infância, e tentar resolvê-lo em si mesmo, e  não projetando no corpo e na vida do outro.
Para 'salvar' nossa percepção a cerca de nós mesmos como pessoas 'humanas', a pesquisa não é conclusiva no sentido de afirmar que a partir desses dados a sociedade tem pouca tolerância à violência à mulher, tanto que para 91% dos ouvidos, a prisão deve ser o destino para os  maridos que batem nas esposas. É, parece que há uma luz...dentro de nós!
Nota: Ontem, dia 4 de abril, o IPEA divulgou que houve um erro nos resultados divulgados da pesquisa e, diferentemente da informação anterior, 26% e não 65% dos entrevistados concordavam totalmente ou parcialmente com a afirmação "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser estrupadas". Em função deste erro, pesquisadores e o diretor de Estudos e Políticas Sociais do Instituto foram desligados por pedido de exoneração. Não deixa de ser um (pequeno) alívio esta emenda, porém, este novo resultado também não é portador de boas notícias, pois traz consigo duas inseguranças, uma, a de que em um universo considerável (26%), ainda cogita-se a violência contra as mulheres e outra, a de que após o 'erro', confiar fica sempre mais difícil.


sábado, 22 de março de 2014

Precisamos de Abraço



Sem querer desmerecer o beijo, sobretudo em sua função erótica, sempre achei o abraço algo mais envolvente, devido seus 'componentes' serem mais, digamos assim, completos.
O psiquiatra francês Michel Lejoyeux, detendo-se a estudar o abraço, deparou-se com uma pesquisa realizada no Japão, onde foi observado o efeito 'calmante' do abraço tanto em bebês humanos quanto em animais (leões bebês). Os estudos prosseguem na direção de afirmar os benefícios que esse contato físico (o abraço) promoveria, por exemplo, em pacientes cardíacos, no sentido de alterar positivamente os batimentos do coração.
Atualmente vivemos em um contraste ao se tratar de Ciência. Por vezes apreciamos uma enorme flexibilidade e aceitação de terapêuticas alternativas, principalmente no estágio último da condução de algumas patologias, quando 'de tudo já foi tentado'; nessa situação, parece haver um 'afrouxamento' dos radicalismos científicos, tanto por parte de profissionais que conduzem o caso, quanto por parte da família, tomada pelo desespero de perder alguém querido. Nesse momento pode tudo, tudo deve ser tentado, tratamentos em teste inclusive. Outras vezes, narizes são torcidos até para especialidades já reconhecidas legalmente pelo Conselho Federal de Medicina, como a Homeopatia. Estes são os seres humanos, apresento-lhes!
Concentrando no assunto que me interessa, o abraço, é sabida a necessidade de contato que temos. Ela é por assim dizer, ancestral. Desde os tempos das cavernas, mantemos contato, encostamos, pegamos, puxamos, esfregamos e tudo o mais que impulsione e faça vibrar nossos sentidos em sua completude, aí incluída também a atividade sexual. Tudo que é relativo ao contato parece funcionar como um regulador natural de nosso psiquismo. Por que não conceber então, que o abraço possa ser uma espécie de remédio para alguns de nossos muitos males físicos e emocionais? De tão natural, de tão simples, de tão 'à mão', poderia e deveria ser utilizado em larga escala, sem contra indicações. Por que não? Preconceito, medo, problemas piores como os TOCs da vida, que tanto nos impedem de trocar com alguém que talvez esteja disposto, querendo e precisando do mesmo que nós? Seria bom, cada um, de forma única e subjetiva, tentar identificar qual a necessidade desse poderoso remedinho... Comentário final do Dr. Lejoyeux: "Imagino o dia em que poderei prescrever a dose diária de abraço naqueles que amamos". Só complementando, creio que nosso trabalho deva ser o de orientar, chamar a atenção para esse 'tratamento', quanto à dose, quem melhor sabe, é a própria pessoa.

terça-feira, 4 de março de 2014

Onda Selfie: A internet faz bem para o ego?


Kim Kardashian, Sempre em Autopromoção.

Inegavelmente um fenômeno global, chegando até a ser considerado pelo respeitado dicionário Oxford , o mais completo da língua inglesa, como a palavra do ano em 2013, o selfie passou a despertar interesse na área da Psicologia. Em sua mais recente edição, a revista francesa Psychologies, trás um artigo que fala sobre a moda que se instalou na internet, sobretudo nas redes sociais, das autofotografias. Pergunta então, se essa atitude de fotografar-se e expor a fotografia na internet teria algum efeito positivo para o ego da pessoa.
O ser humano sempre teve uma necessidade de 'aparecer'. Provavelmente o selfie reporta aos autorretratos que existem desde o século V a.c., sob forma de esculturas, avançando nos séculos posteriores como pinturas. A ideia de mostrar-se ao mundo não é atual. A motivação é variada, seja para marcar território, seja simplesmente para praticar uma espécie de autocontemplação: Me posto, me vejo, me admiro, massageio meu ego. 
O questionamento parece ter uma resposta positiva. Sim, postar selfie faz bem ao ego, se fosse o contrário, que instinto masoquista moveria quem o faz? O 'grau' de influência positiva que o selfie terá, dependerá da individualidade de cada um, ai incluídas suas características, suas necessidades, suas carências, sua necessidade de exposição. Quem usa de maneira assídua o selfie denota uma enorme necessidade de exercer a autoadmiração e de buscar a admiração dos outros. Como num ritual, várias fotos tiradas pelo celular, este sempre a mão, conduzem o modelo a exercer seu lado narcísico. Em adolescentes, um certo grau desse narcisismo é até desejável, fazendo parte da crise normativa que se instala na adolescência, visto que é nessa fase que a partir do autoerotismo constrói-se uma imagem única e diferenciada de si mesmo em relação aos demais, processo este fundamental na construção da identidade.
Amigos em situações de alegria e confraternização também utilizam-se do selfie para registrar os momentos em grupo. Além da praticidade, é um registro fiel do sentimento do momento; este ficará impresso de imediato e para sempre, perpetuando esses fragmentos de felicidade tão importantes em nossa vida. Uma característica positiva a mais desses momentos é a sua imprevisibilidade; sempre tem nessas ocasiões, alguns desavisados, os que não posam para a foto, os que são pegos de surpresa no selfie 'grupal', assim tendo registrada sua maior espontaneidade, situação aparentemente contrária ao selfie, que preconiza o parar, arrumar e posar. Este recurso foi usado pela apresentadora americana Ellen DeGeneres, na recente festa do Oscar 2014.
Dentro de um padrão fora do exagero, o selfie é bem vindo e sim, pode representar satisfação. Agora, pessoas que se concentram tão somente nos selfies, com caras e bocas, e anulam qualquer outra fonte de interesse na net, nas redes sociais, que inclusive tem essa característica de promover a 'troca' entre indivíduos, podem estar construindo um padrão patológico onde, sem perceberem, ao contrário de alimentar o ego com elementos construtivos, isolam-se em seu comportamento narcísico, em um mundo próprio e artificial, como as imagens paradas, arrumadas e sem vida desses intermináveis ensaios fotográficos. Afinal, todos conhecemos o fim de Narciso.

domingo, 2 de março de 2014

Comunicação



Um dos maiores facilitadores nas relações humanas é a comunicação entre as pessoas. Quando esta não flui, nossos objetivos, tudo aquilo que desejamos, pode ficar comprometido.
Há muito que se deixou de privilegiar o Q.I. (quociente de inteligência) como fonte única de sucesso e realização na vida das pessoas, pois este avalia prioritariamente as capacidades cognitivas do indivíduo. Hoje, preconiza-se muito mais do que aquilo que consideramos 'inteligência'; Valoriza-se atualmente um conceito conhecido como 'inteligência emocional', esta definida como a capacidade da pessoa em reconhecer seus sentimentos e de quem as cerca, bem como lidar de maneira assertiva e satisfatória com eles, incluindo aí o manejo das frustrações que invariavelmente fazem parte da vida.
É como se o Q.I. fosse um elemento isolado, representado por características tão somente intelectuais, deixando de fora o que mais nos representa como seres humanos, que é nossa capacidade de nos relacionarmos com as pessoas e o mundo em que vivemos de maneira global, inteira.
Daí vem a importância fundamental da comunicação. A maneira como chegamos e como permanecemos nas situações ou nas relações vai estar relacionada totalmente com a qualidade dessa comunicação. De coisas mais simples, já propagadas pelos linguistas, como o simples tom e ritmo da nossa voz, até as mais complexas (aí entrando seu dúvida o conhecimento 'intelectual'), como o saber dissertar sobre determinado assunto quando necessário. 
Parece que ninguém terá sucesso na vida, entendendo sucesso como um resultado que leva ao contentamento, ao prazer em viver, a felicidade, se não souber onde e como pisa. Hoje não há mais lugar para amadorismo, seja nas relações pessoais ou profissionais.
Começando no lugar mais frequentado, nosso lar,  onde já devemos exercer nosso 'laboratório' da comunicação. É lá que, com nossos próximos mais próximos, deveríamos aprender a desenvolver essa capacidade de partilhar informações, partilhar vida, que é o que define a comunicação. Este ato levará ao incremento de nossa inteligência mais completa, a emocional.  Se não nos esforçamos para iniciar e manter uma comunicação com esses seres, que quase sempre nos apresentam o que é a vida, uma etapa importante do processo ficará prejudicada. Família que conversa, discute, briga, cresce, discorda, troca, certamente estará produzindo indivíduos mais verdadeiros, mais 'pulsantes', que terão fora dela - da família - mais chances de acertar.  

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Tô na Pista



Depois de uma separação, passados os primeiros momentos, observamos duas situações: Caso a pessoa não quisesse se separar, ficará primeiramente 'enlutada', como se algo de grande valor tivesse ido embora. Ou, a separação é símbolo e prenúncio de coisas muito boas que estarão por vir. Sim, porque quando a separação significa fechamento de um ciclo, alívio, comum acordo, libertação de uma situação desagradável, quebra de um longo processo de engessamento e outros, só representa coisas boas!
De uma maneira ou de outra, eis que chega o dia que dá uma vontade de 'voltar à pista'. 'Voltar à pista' significa estar internamente disponível para um próximo relacionamento.
Entendendo que parece que o ser humano não foi 'projetado' para ficar sozinho, em algum momento, alguém ao lado chamará nossa atenção. Sensação boa essa; de continuidade, de sentir-se interessante, de sentir-se desejado, de festa no interior, emocionalmente falando.
O momento certo é esse. Quando você percebe que alguém lhe despertou interesse, você teve vontade de sorrir, de se aproximar, de conversar. Em meio à tantas coisas que você poderia estar fazendo naquele instante, foi essa sua preferência. 
Estabelecer um contato  inicial, sem se preocupar com o que possa acontecer, é uma atitude bem vinda nesse momento. Não há como concluir nada. Demanda tempo conhecer alguém, para que se possa tirar algumas primeiras conclusões. Nessa fase, nem é prioridade conhecer o outro; é mais útil, observar-se, sentir-se como protagonista de uma escolha. Aí sim, 'queimada' essa etapa, quando você já não consegue mais disfarçar (para você mesmo), seu interesse, você pode começar a tatear, para checar quem é esse outro tão interessante a seus olhos.
'Voltar à pista' não é complicado. As pessoas é que complicam. Ao nosso redor, sempre tem pessoas procurando alguém para dividir a vida, das mais diversas maneiras que isso possa significar, porém devemos ficar atentos para o que pode atrapalhar. Muitas ideias românticas podem assolar as pessoas nessa condição, inclusive a tão proclamada 'química' entre casais. Não estamos em um laboratório e tão pouco somos elementos químicos prontos para ter alguma reação imediata ao entrar em contato com outro elemento, provocar explosões, mudanças de estado, de cores etc. Somos seres humanos complexos, com histórias, com sentimentos, com maneiras específicas e exclusivas de se relacionar com outro ser humano igualmente complexo a nós. Se estamos esperando algo mágico, poderemos ter como resultado uma imensa frustração. Poderemos errar feio, e assim desprezar a possibilidade de encontrar alguém para conosco prosseguir, na pista e na vida. 

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

É Hora de Acordar



O tempo vai passando em uma velocidade que não conseguimos acompanhar. Horas, dias, meses, anos, décadas! A vida realmente é um sopro; nascemos e, colecionando aniversários, quando se vê, lá se vão anos, lá se vai uma vida!
Por conta dessa rapidez com que nossa vida passa, cabe perguntar o que estamos fazendo com ela.
Será que estamos levando tudo com excessivo rigor, excessiva preocupação, sem nos dar chance de funcionar realmente da forma que queremos?
Quantas vezes, ao analisar nosso dia, situações que acontecem com nossos próximos, não percebemos que muito do que ocorreu foi desnecessário? Quantas vezes 'forçamos a barra' para que algo aconteça ou, ao contrário, negligenciamos de forma a não acontecer o que queríamos?
Será que não ficamos demasiadamente ocupados fazendo planos e esquecemos de realizar o que é viável? Até quando construiremos grandes fantasias e deixaremos de viver o aqui e agora?
Na interface entre vida e morte temos todas as explicações que precisamos para entender e privilegiar os momentos que realmente deveriam valer a pena e descartar os momentos que em nada acrescentam, ao não ser estresse, raiva, insatisfações, distanciamento de pessoas que valorizamos etc. Sem perceber, levados por uma ansiedade difusa (pra que?), irmã de um desconforto que domina tantas situações que eram pra ser prazerosas somente, desprovidas de qualquer tensão, nos deixamos levar por uma grande gama de coisas que não tem importância, no sentido de agregar valor à nossa vida.
Às vezes parece que não temos consciência de nossa finitude. Ou por não determinarmos um mínimo 'projeto' de vida, ou por um movimento oposto, deixarmos a ilusão do controle dominá-la. Sabemos que um dia morreremos mas esse assunto não nos agrada, e por esta razão, parece que cria-se um tabu em torno dele a tal ponto que construímos uma reação neurótica que nos impedirá por muito tempo desse confronto. Em uma primeira análise, parece que esse funcionamento nos protege, porém, esta é apenas uma falsa impressão. A verdade é que ele nos leva a um grau de alienação tão grande que ofuscará a única forma que temos para conviver melhor, de forma menos dolorosa, com a ideia de que um dia tudo acaba - ou melhor, nós acabaremos -, que é reconhecendo esse fim. 
Ultrapassando essa etapa - a da negação - e alcançando essa outra - a do reconhecimento da finitude da vida -, conseguimos ser mais leves, mais dispostos a valorizar o que realmente importa, descartando as inutilidades, privilegiando o contato humano. Percebemos assim que, nas coisas banais que estão disponíveis a qualquer tempo e hora, podem concentrar-se os maiores mistérios da beleza da vida e do viver. Como disse o poeta: "Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido". Fernando Pessoa.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Traição: Pode Acontecer


Keira Knightley no filme Anna Karenina
Na prática clínica existe uma espécie de investigação natural acerca das ocorrências da vida do sujeito analisado em cada sessão do processo.  Por várias razões somos tentados - analista e analisando - a buscar conhecer aquilo que impulsiona o indivíduo a realizar determinadas ações. Tudo parece ter e fazer algum sentido; tudo tem uma razão de ser.
Com a traição não é diferente. Os dois lados da história e possivelmente a terceira pessoa envolvida também, provavelmente indagam-se o porquê do acontecimento. 
Existem aquelas pessoas que são 'traidores de carteirinha', pois acumulam vários episódios e até casos em seu 'currículo'. Contumazes que são na  'arte' de trair, seja por serem sedutores natos, que transbordam uma 'sensualidade fatal e exacerbada' ou por apresentarem problema de auto-estima (tenho que sempre reafirmar a mim e aos outros que sou capaz, não importando capaz de que).
Há aqueles que provavelmente traíram sem razão de ser, simplesmente aconteceu. Nesses casos, cabe uma análise feita pelo agente (o que traiu) acerca de suas motivações, seus porquês.
O primeiro olhar recai sobre o relacionamento 'oficial'; como ele está? Com certeza, a resposta não será: "Muito bem obrigado". Situações (ou a ausência delas) provocaram a traição do 'agente'. Há distanciamento já instalado no casal? Há acúmulo de tensão por situações mal resolvidas - ou nem faladas -, seja por falta de interesse ('deixa pra lá, amanhã é outro dia') ou por achar que não é válido, não importa, não acrescenta?
É comum ocorrer entre casais 'velhos', se é que me entendem, aquele casal que já tem alguma estrada, alguns anos de relacionamento, a falta da dedicação que ocorre no início do relacionamento; supõe-se que o outro saiba meus desejos, as palavras que eu quero ouvir, as que doem. Supõe-se que o outro ganhou um reservatório de carinho e atenção que durará a vida toda. Não! Alto, sonoro e enfático.
A única possibilidade que existe de um casal (tentar) passar imune às traições é cultivando atitudes que fazem a diferença no relacionamento. Não podemos esquecer que nós, os seres humanos, estamos a todo momento chamados à promessas de felicidade e estas nos seduzem e podem abrir as portas para a traição. Quem não quer felicidade total, prazer absoluto, humor sempre maravilhoso, resumindo, quem não quer gozar a e na vida, no sentido mais amplo da palavra? Resposta: Toda a fila dos pobres mortais; admitam ou não, enxerguem ou não. Aí é que mora o perigo! Se o cuidado não é fomentado no dia a dia, nas pequenas coisas, se deixamos o comodismo e a preguiça dominar a cena, bater ponto todos os dias, na casa e na cama, vai ficar difícil... e um dia é um dia, pode acontecer.
Ambos, homens e mulheres traem; é uma fato histórico, bíblico. O cinema explora o tema com maestria, para nosso deleite e aprendizado, para que possamos através da arte apreciar a vida como ela é. Agora, passar uma vida nesse desassossego afetivo, onde nada parece bastar, satisfazer, trazer felicidade, é matéria para se pensar.